18.12.13

Avante



Sentei-me para escrever. e não obstante sentir a dor do silêncio enferrujado dos dedos me tomar, como fazia Bukowski pelas manhãs depois de uma noite de bebedeira e abstração psíquicas, ressaca... meses de ressaca, anos de ressaca por que não dizer assim, sentei-me para escrever. As ruas continuam as mesmas, podres, sujas, com pessoas sujas nas calçadas, com pessoas podres nos restaurantes caros da Paulista, mas eu... bem, eu sou outro, desapaixonado por qualquer quadro, andei durante todo este tempo passado, vi as mesmas molduras, os mesmos quadros, mas "despoetizei" as ruas, "desverbalizei" meus olhos e meus dedos, com um ar inerte cobri com o véu do silêncio as vestes deste blogue, aleijei para com os sentimentos sentidos, mas cá estou, como um Bukowski de ressaca, com o gosto amargo do tabaco e do álcool dormidos na boca, no pensamento, me "redispondo" a escrever verbos que não existem com próclises desaprumadas e neologismos medonhos, como a vida também se faz, em neologismos medonhos e verbos anômalos que surgem a cada pensamento, a cada conversa solta ou a cada pausa do trago, com o convívio com pessoas desaprumadas e anômalas, mas qual delas assim não é?

Ainda fumo dos mesmos cigarros, ainda deito os olhos na poesia escura dos cantos das ruas, dos lábios rachados e dos olhos vermelhos do cansaço da lida, ainda vejo poesia no canto doido e solitário do morador de rua ou nos pombos que lutam pelo resto de comida com este, o carvão da cidade ainda pode tomar de mim as construções catatônicas que outrora me casaram com este espaço, que me desposaram com o agressivo da cidade sob o ângulo débil dos meus olhos.


A vida retoma seu fluxo entre meus dedos trêmulos, amarelos de cigarro e este espaço.
Avante.